Não façam nada por mim!
Uma das vantagens de se viver em um país europeu é a diversidade cultural. Segundo números oficiais, mais de 10% da população é de estrangeiros. Sem contar os imigrantes clandestinos. São pessoas do bem e do mal, de todos os cantos do planeta. No breve curso de italiano que fiz, aqui, dividi a sala com uma russa, uma romena, uma americana, uma polaca e uma inglesa. Conhecer suas culturas, entender um pouco estes países e seus costumes é indiscutivelmente o maior aprendizado. Entre os milhares imigrantes que aqui vivem, naturalmente alguns sentem falta de seus países de origem, mas preferem morar na Itália. Outros só pensam em voltar e alguns, só pensam em ficar!
Eu, como uma observadora e curiosa da vida alheia, observo tudo e todos. Hoje de manhã, avistei pela janela uma africana com três crianças conversando com um casal de idosos italianos. As meninas, com os cabelos cuidadosamente trançados. O menino, de shorts e sandálias. A mãe, de saia, sandália e uma bata. A cena não trazia nada de mais, mas fiquei ali, observando o bate-papo que fluía normalmente e, por alguns minutos, pensei. "Será que ela sente falta de seu país? Talvez sim... Talvez tenha fugido da perseguição religiosa que arrasa muitas nações africanas. Ou dos duros regimes políticos."Continuando com minhas divagações, pensei que os países ricos deveriam fazer alguma coisa para evitar este êxodo. Prover uma vida digna a todos para que possam viver em seus países, com suas tradições e familiares sem ter que se adaptar a um outro mundo só porque um grupo os persegue até a morte. Pelo menos, a saída do país seria uma opção não a única alternativa de vida
Foi então que pensei em mim.Não! Não façam nada para me levar de volta ao Brasil! Deixei-me aqui, nesta cidadezinha pequena e tranquila, num cantinho qualquer da Itália, onde a escola pública é maravilhosa. O médico de família realmente existe, a violência é algo distante e irreal. Onde a burocracia emperra a vida - é verdade - mas graças a ela, é quase impossível dar um "jeitinho", que tanto corrompe o Brasil.
Por que eu haveria de querer voltar para um país onde o presidente cria uma imagem irreal da nação e o povo acredita! Por que eu iria querer voltar para um país onde o dinheiro público financia um filme sobre a vida de Lula em pleno ano eleitoral (lançamento previsto para janeiro de 2010!)? Sim, dinheiro público sim, já que entre os patrocinadores estão a Odebrecht, OAS e Camargo Corrêa. Empresas com contratos milionários com o executivo (nos dois últimos anos, já receberam mais de R$ 1 bilhão dos cofres públicos!). O filme sobre Lula, aliás, é o maior orçamento da história do cinema nacional: R$ 12 bilhões.
Às vezes penso que todos têm razão e a louca sou eu. Por que eu não adoraria viver num país onde a crise econômica o deixou ileso e o crescimento para 2010 está previsto para espantosos 4,5%, quando a maioria do resto do mundo ficará nos tímidos 1%? Simplesmente porque este país só existe dentro da cabeça e dos discursos de Lula.
A realidade é outra. Lula compra os necessitados com o Bolsa-Família (e pode me chamar de imbecil e ignorante, senhor presidente). O dinheiro público vai para o bolso das campanhas políticas e o atual Congresso e a Justiça são as pontas mais fracas e sujas das instituições democráticas do país.
A realidade é que, enquanto a Europa passa por amargos 9% de cidadões desempregados, num momento de severa crise econômica, este patamar costuma ser o "normal" para os padrões brasileiros.
A realidade é que o Brasil crescerá, em 2010, o mesmo que a Ucrânia, um dos países mais atingidos pela crise do século XXI. Depois de amargar um recuo no PIB de 15% e de outros 20% no ano passado, o crescimento da Ucrânia será o mesmo que o Brasil (onde se diz que não há crise
Esta é só uma parte da realidade brasileira. Acredite, quem quiser. Por mim, podem me esquecer aqui, neste pedacinho de terra onde africanos, romenos, russos e tantos outros estrangeiros lutam por uma vida digna.
Aliás, a africana também não sente saudades de sua terra natal. Está feliz na Itália, onde mora há seis anos e sequer pensa em voltar. Encontrei-a poucas horas depois no mesmo armazém onde compro mantimentos de emergência.
A África e o Brasil que nos esqueçam, por favor!
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