Vivendo em Londres: Seu passado lhe condena. Ou não!

Você está procurando emprego em uma grande empresa? Colecione boas ações, faça uma lista com todas elas e prepare-se para vender o seu melhor produto: VOCÊ!

A dica pode parecer óbvia para os que estão acostumados a entrevistas de trabalho. Para outros, um absurdo total se gabar das boas atitudes para conseguir um trabalho. Para mim, que há anos não era entrevistada para uma multinacional, senti-me estranha quando me pediram: “cite um exemplo de algo que você tenha feito que mostre suporte aos seus amigos e colegas de trabalho”. A frase soa banal e até rotineira, não? Típica de uma entrevista de emprego. Ah, mas para mim, tudo tem que ser um pouco mais complicado. Sempre!

Diante das duas entreivstadoras (uma fazendo as perguntas e a outra anotando tudo), estiquei um sorriso discreto e comentei em voz baixa, como se falasse comigo mesma: “Puxa, são tantos!” Em um inglês já quase fluente, sem muita indecisão. E ela emendou: “Que bom pra você! A maioria é jovem e não tem muita coisa pra contar.”

Criou-se um clima de expectativa na sala e ambas sorriram gentilmente para mim (britânicos são tão dóceis, de verdade!).

Ainda com aquela sensação de ter muito o que dizer, respirei fundo e ... não consegui me lembrar de nada específico! Tudo o que me vinha à mente era óbvio demais e não me pareceu ser a melhor resposta. Segundo a segundo, as palavras iam sumindo da minha boca. Acabei me enrolando, não citando nada, sendo apenas vaga (e idiota): “Para mim é natural dar suporte aos que me estão próximos porque é assim que eu sou, gosto de ajudar as pessoas”. Claro que não era isso o que elas esperavam ouvir, ainda mais depois do comentário antecipado que eu fizera.

Não fui a escolhida. E, obviamente, saí de lá com uma sensação de fracasso tremenda.

Voltei à casa com um nó no estômago e uma bola na garganta de coisas que eu deveria ter falado e não falei! Eu poderia ter dito que me dá muito prazer poder ajudar os novatos, por exemplo, e citar dezenas de exemplos que me deram o apelido de “mammys” em dois lugares por onde passei; afirmar que cansei de dobrar a carga de trabalho só para desafogar um colega (e não contar a ninguém); que já defendi minha chefe de um diretor tirano (e mantive a postura, custasse o que custasse); que dei inúmeras carona aos colegas somente pelo prazer de ajudá-los e estar mais tempo com eles  (mesmo que não fosse exatamente a minha rota), ou ainda, que sempre apoiei os amigos em decisões difíceis, ouvindo e aconselhando sem julgar e, por fim, que nunca pensei duas vezes para levar minha amiga ao hospital para as sessões de quimioterapia (a 200Km de distância) e que lia jornais pra ela todas as manhãs só para estar em sua companhia depois do enjôo matinal...

No caminho para casa, flashes da minha vida e da pessoa que eu sou foram surgindo aos montes em minha memória e o nó no estômago só aumentando, com o coração disparado de raiva! Eu tinha muito a falar sobre mim, mas por que não falei? Por que nem sequer me lembrei de citá-las?

Porque, no fundo, nunca pensei que atitudes de amizade,  carinho, coleguismo e amor ao próximo fossem troféus a se exibir em uma prateleira. Não é algo que você tem em sua lista mental e lança mão quando precisa. São atitudes que se toma e simplesmente esquece, depois! Não é algo que se guarda para ser cobrado um dia.

Fui recusada para a vaga não por falta de capacidade profissional, porque estas informações eles tinham em meu currículo e o aprovaram. Fui recusada porque não soube me vender, não soube convencê-los de quem eu sou. Fui recusada por não ter me preparado para a entrevista. Nunca precisei, antes. As poucas vezes em que mudei de emprego foram sempre por indicação de ex-colegas de trabalho que, conhecendo a pessoa que eu sou, passaram pela entrevista de caráter em meu lugar. Era apenas entrar, assinar o contrato e começar a trabalhar.


Aqui, do outro lado do oceano, ninguém sabe quem eu sou ou que tipo de vida eu tive. Preciso me lembrar disso. Parece óbvio, mas as coisas mais óbvias são as mais fáceis de se esquecer. Da próxima vez, estarei melhor preparada. 

*** ATUALIZAÇÃO EM 07/11/2013
Ligaram-me, hoje de manhã, para me dar a ótima notícia de que fui aprovada na entrevista! Fiquei chocada, mas feliz, claro!!!!!! No final da conversa, percebi que não seria colocada exatamente na filial para onde eu me inscrevi, mas em outra filial, no centro de Londres.
Em janeiro começa a minha nova aventura!
Aqui vou eu! 

Comentários

Chris disse…
Nossa, ja fiz tantas entrevistas aqui que ate perdi a conta, varias em multinacionais. Hoje trabalho numa empresa britanica, mas bem grande aqui, mas ja trabalhei na Disney e na Nickelodeon. Em todas as entrevistas perguntam coisas pessoais, tipo esportes, filmes, o que fazemos na hora de lazer, relacao com familia, etc. Tambem ja fiz parte de processo de entrevista do lado da empresa e achei meio escroto - nem tudo é o que parece ser...
Dila M.P. disse…
Ah.. Érika.. como eu sei do que vc está falando !!
Entrevistas, na verdade, sempre são uma preocupação. Como entrevistada sou sempre preocupada, e acabo metendo os pés pelas mãos, tbm.. e como entrevistadora (já fui muito !!) tbm não me sinto à vontade.
Como 45 minutos podem definir uma pessoa ??
O fato é que precisamos nos
preparar para o marketing pessoal sim.. e fazer o que para alguns é extremamente natural, transformar nossas boas ações em argumentos de auto promoção.. ah.. sim.. parece comercial demais, para piscianas como nós ?? Mas é assim que tem que ser, porque claro, no dia a dia, a gente se garante e MUUUITO MELHOR que tanta gente.. o dificil é resumir isso em tão pouco tempo ser parecer soberba...

ah.. como eu sei exatamente o que vc está falando... rsrs
Anônimo disse…
Fantastica experiencia! Muito encorajadora e desejo tudo de bom a voce!
ganhar curtidas disse…
Muito bom post gostei muito !
Daiane Tozzi disse…
Parabéns!!!!
Gente boa merece coisa boa :)